A votação surpreendeu a maioria, já que
o FAM se constitui como um documento extremamente gravoso para os Municípios e,
em particular, para o concelho de Palmela, quer na sua génese política - pelo
desequilíbrio entre a comparticipação exigida aos Municípios e ao Governo e
pela grave ingerência na gestão de quem necessitar de recorrer a este fundo -
quer pelas medidas concretas que apresenta e pelo esforço financeiro que
representará, contribuindo para desequilibrar quem, apesar das dificuldades,
mantém, ainda, uma situação financeira estável.
Em concreto, a contribuição exigida a
Palmela cifra-se nos 2.348.163 euros, distribuídos em cinco tranches anuais de
cerca de meio milhão de euros cada. Este valor inesperado, a disponibilizar já
a partir de 2015, onerará o Orçamento Municipal com uma despesa adicional, que
condicionará a capacidade de investimento do Município nos próximos anos, com
repercussões para os serviços prestados, para as obras e projetos a inscrever
nas Grandes Opções do Plano e, consequentemente, para a qualidade de vida das
populações.
A ajuda aos Municípios com problemas
financeiros é importante e, para tal, a maioria CDU apresentou um pacote de
medidas, mais eficazes e com menos condicionantes, que se constituem como
alternativas sérias a este Fundo.
A Moção, cujo texto integral se
reproduz abaixo, foi apresentada em reunião pública descentralizada, no Centro
Cultural de Poceirão, a 18 de junho, no âmbito da Semana de Poceirão, e foi
aprovada por maioria, submetendo-se, agora, a deliberação da Assembleia
Municipal.
«O Governo remeteu à Assembleia da República a Proposta de Lei 232/XII,
aprovada em Conselho de Ministros de 5 de junho, que estabelece o regime
jurídico da recuperação financeira municipal e regulamenta o FAM – Fundo de
Apoio Municipal. Este Fundo, previsto na Lei das Finanças Locais (Lei 73/2013,
de 3 de setembro), carecia, desde então, de um diploma próprio que
estabelecesse as regras conducentes à sua operacionalização, nomeadamente, estrutura,
termos e condições de capitalização e funcionamento.
O documento, agora apresentado para discussão na Assembleia da República,
prevê que o FAM se cifre nos 650 milhões de euros, dos quais 455 milhões
(setenta por cento) caberão aos Municípios e os restantes trinta por cento ao
Governo. Concretizando o impacto desta medida na realidade local, a
comparticipação obrigatória do concelho de Palmela para o FAM é estimada em
2.348.163 euros, distribuídos em cinco anos, a partir já de 2015, resultando
numa tranche anual de cerca de meio milhão de euros.
A desproporção da contribuição exigida aos Municípios é ainda mais
gritante quando se verifica a existência de verbas disponíveis no PAEL, o
Programa de Apoio à Economia Local, anterior instrumento de recuperação
financeira das autarquias que consistia num empréstimo de mil milhões de euros.
Além do grande esforço exigido a todos os Municípios, o FAM surge
enquadrado por um pacote de medidas que tolhe, de forma dramática, a autonomia
dos Municípios que a ele recorrerem, numa ingerência sem precedentes do Governo
no Poder Local Democrático, sufragado pelas populações, que vai do aumento de
taxas, tarifas e preços dos serviços prestados à limitação da atividade e à
redução do serviço público.
Somos, assim, levados a concluir que o FAM, nos moldes em que se afigura,
será mais um “presente envenenado”: para os municípios em dificuldades,
constituirá uma troca injusta, condenando autarcas a uma limitação na
concretização dos seus programas e as populações a uma diminuição da qualidade
de vida; para os restantes municípios, constituirá um acréscimo pesado aos
orçamentos, que, no entanto, em nada contribuirá para o desenvolvimento local.
Apesar das situações de carência de recursos financeiros vividas,
atualmente, por alguns municípios, não podemos esquecer que, para tal, muito
contribuíram os cortes sucessivos nas transferências do Orçamento de Estado
para os municípios, a redução da sua participação nos impostos do Estado, a
imposição de novas competências sem o acompanhamento dos respetivos meios ou o
não pagamento pelo Governo de serviços prestados pelas autarquias.
Convicta de que a presente Proposta de Lei atenta contra a autonomia do
Poder Local Democrático, consagrada na Constituição da República Portuguesa, e
contrariamente ao que a designação “Fundo de Apoio Municipal” indica, conduzirá
os Municípios a um novo patamar de deterioração da sua situação financeira e do
serviço público prestado, em áreas tão importantes para o quotidiano das
famílias, como a educação ou os serviços de água e resíduos sólidos urbanos, a
Câmara Municipal de Palmela, reunida no Centro Cultural de Poceirão, a 18 de
junho, delibera:
1. Recusar liminarmente o conteúdo da Proposta de Lei 232/XII, na medida
em que não assegura a justa repartição dos encargos entre os Municípios e o
Governo, contrariando os interesses dos territórios e das suas comunidades,
constitui uma grave ingerência na gestão municipal e põe em risco a
estabilidade de Municípios com situação financeira equilibrada, num esforço,
embora solidário, desproporcional e desajustado às suas possibilidades e
responsabilidades no campo da coesão social nacional.
2. Reivindicar a negociação séria e plural com os Municípios de medidas de
reequilíbrio financeiro, em respeito pela autonomia do Poder Local Democrático,
pelo serviço público de qualidade e pelos direitos das populações.
3. Exigir a alteração da Lei das Finanças Locais, de modo a assegurar:
- a defesa da recuperação da capacidade financeira dos Municípios;
- a reposição da autonomia administrativa e financeira, de acordo com a
Constituição;
- o aperfeiçoamento de instrumentos de saneamento financeiro já existentes
e a discussão de propostas já apresentadas, como
a) a
reposição do IMT como receita municipal;
b) o reforço da participação dos Municípios nos impostos do Estado,
repondo o valor de 25,3% da média aritmética da receita proveniente do IRS, do
IVA e do IRC;
c) a densificação do instrumento de saneamento financeiro, com a
introdução do processo negocial direto com os credores, incluindo os bancos,
através da negociação de montantes, prazos e juros, abrangendo expressamente a
intermediação financeira;
d) a disponibilização pelo Estado de recursos financeiros, incluindo a
prestação de garantias, como complemento do processo de renegociação com os
credores e de financiamento bancário para o saneamento financeiro;
e) o estabelecimento de um Plano de Reequilíbrio Financeiro, que aponte
soluções que permitam resolver o desequilíbrio financeiro, sem onerar as
populações e sem pôr em causa o funcionamento pleno dos serviços públicos e da
atividade municipal;
f) a
revogação da Lei dos Compromissos e dos pagamentos em atraso.
4. Dar conhecimento da presente Moção a:
- Sr.
Presidente da República;
- Sr.
Primeiro-Ministro;
- Sr.ª
Ministra de Estado e das Finanças;
-
Grupos Parlamentares;
-
Associação Nacional de Municípios Portugueses;
-
Associação de Municípios da Região de Setúbal;
-
Assembleia Municipal de Palmela;
- Assembleias de Freguesia do concelho de Palmela;
-
Comunicação social».